segunda-feira, 12 de março de 2012

Quando a arte existe apenas pela arte

Ele adentrou o pub, cumprimentou com acenos da cabeça alguns conhecidos e foi para o seu local de costume.
Era uma mesa em um dos cantos do pub, meio escondido, mas havia uma pequena janela ali. Era uma janela estreita, e mesmo ela parecia se esconder na parede, porém garantia uma boa visão do mundo lá fora.
Sentou-se ali apenas pelo simples prazer que aquele canto o trazia. Podia sentar-se com alguns conhecidos, poderia ter trazido alguns amigos, até mesmo alguns inimigos. Nunca se deve esquecer da importância de se manter inimigos. Entretanto, aquele lugar possuía alguma magia, ou pelo menos ele acreditava nisso.

Com um sinal pediu um café irlandês ao rapaz atrás do balcão. O café vinha em uma caneca alta, e o tempo estava frio. Perfeito, você poderia pensar, caso goste deste tipo de local e de bebida.
Largou uma folha em branco sobre a mesa e uma caneta. Ali, naquele local, a inspiração fluía facilmente.
Olhou para as nuvens, pela janela estreita, e lembrou do feixe. Pensou consigo mesmo se haveriam feixes verdadeiros em algum lugar nesse mundo, ou nesse quando.

Ficou lá durante meia hora, viu muito acontecer, fez algumas notas, mas nenhuma história realmente surgiu.
Pediu um outro café, preto, antes de partir.
Bebeu e olhou para o mundo ali dentro.
Dois casais, dois grupos de amigos, um rapaz aparentemente esperando alguém e uma moça bêbada saindo do  banheiro aos tropeços.
Qualquer coisa ali daria uma boa história.

O que lhe veio não foi uma inspiração. Talvez possa chamar de epifania. Mas o mais correto seria uma memória já desgastada.
Pegou a folha, aquela com as notas, e a rasgou.
- Agora morreu.
Pegou duas folhas em branco e as rasgou também. E então murmurou.
- Pois haverá vida após a morte? São papel, estão mortos. Mas com vocês crio vidas de mentira. E as rasgo, as mato. Agora lhes dou vida novamente.
Após esse pequeno rito começou a moldar os pequenos pedaços de papel. Não os havia rasgado de forma consciente, mas sabia que estavam rasgados da forma correta. Era o destino... bem, ele acreditava nisso ao menos.

Com os dois pedaços de uma folha em branco, fez dois gatos de origami. Com os da outra folha, uma rosa. Com os pedaços cheios de notas, várias estrelas.

Bebeu todo o café preto, levantou-se. Quando passou pela mesa do rapaz que esperava alguém, lhe jogou a rosa.
- Dê a ela.
Continuou em frente, sequer olhando a reação do rapaz. Ao se aproximar da moça bêbada ela quase caiu, ele a ajudou a se equilibrar e lhe deu os dois gatos. Ela olhou o presente e levantou o olhar para ele que ainda a fitava.
Então ela correu para a mesma mesa aonde ele estava a poucos momentos e começou a chorar. Ele mandou que lhe servissem um café e continuou a caminhar.
À um dos grupos de amigos ele jogou as estrelas. Todas repletas de histórias. Algumas incompletas, mas às vezes é o fato da história ser incompleta que a deixa cativante.

Pagou sua conta e saiu para o frio da noite. Olhou para as nuvens, agora jé em um céu iluminado apenas pela luz refletida na lua, e lá estava ele. O feixe não dorme. Caso ele exista, é claro.


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