domingo, 26 de agosto de 2012

A Chama e a Chuva


Sento no escuro, escuto a chuva cair lá fora.
Acendo meu isqueiro para ver sua pequena chama crescer em meio ao breu e iluminar o meio sorriso estampado no meu rosto.
E pensar, meu nobre isqueiro, que você será uma eterna lembrança de uma conquista que cheguei a imaginar intangível, inalcançável.
E tu, meu caro sorriso, que pela metade é sempre o mais sincero, lembrando de tudo e todos que tentaram te fazer sumir. Te abre um mínimo e por teus lábios escorre um fio de ar, trazendo novamente a escuridão ao meu redor.
A escuridão e o som da chuva. Tão belas, tão tristes. Magníficas em seus significados, em suas memórias tão belas e tristes quanto si mesmas. Aliás, por serem assim trazem consigo essas lembranças ou são as lembranças que te fazem serem assim?
Afinal, e mais importante, isso importa? Não, claro que não, é simplesmente assim.
Lembro de quando me desafiaram. De cada momento em que isso aconteceu, e de cada resposta que dei. Lembro das respostas ainda pendentes. Lembro do medo nos olhos de alguns, da coragem nos olhos de tantos, e da prepotência nos olhos de muitos.
Lembro das tolices, e da alegria vã.
Lembro dos saberes, e da tristeza infundada.
Lembro da decepção, e de como me deixei abalar inutilmente.
Lembro da esperança, e dos erros que ela traz consigo.
Lembro dos sabores, das cores, dos toques, e recordo que tudo é importante, na mesma proporção que nada é importante.
Ainda desejo tantas vinganças.
Acendo meu isqueiro, dou uma piscadela, e meu sorriso se abre anda mais.
Ainda desejo tão bem a quem nem sabe.
Aquela velha frase, que em algum lugar li [ou ouvi, não que isso importe], volta à memória, tão simples, tão fatal.
Já morri e nasci, tanto e tanto, era assim que vivia, eterna renovação, eterna mudança, tão pequenas, tão singelas, tão completas. Eternos zeros, eternos erros, eternos acertos.
Derrotei a imaginação, e a recriei. Tentei e errei, e isso, apenas isso me derrubou. Meus erros, dos teus eu sempre me livrei facilmente, recordas?
Já fui poeta, mas não faço poesia.
Já fui artista, mas minha arte nunca foi arte realmente.
Já fui amado, mas amor não existe.
Já amei. Oras, e quem nunca foi tolo?
Te apago, amigo isqueiro, e teu cheiro se mistura ao som da chuva e ao negrume dessa sala.
Eu tentei, meu bem, não eu, mas um outro eu que já morreu.
Morreu, morri, pois aquela simples frase sempre foi fatal, mesmo quando eu não a conhecia.
Afinal... não final... não há final além do ponto final.

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